domingo, 24 de outubro de 2010

SOBRE FÉ E MAR

Devocional por Jason Simões

“Logo em seguida, forçou seus discípulos a embarcarem e seguirem antes dEle na outra margem, para Betsaida, enquanto despedia a multidão. E, deixando-os, foi à montanha para orar. Ao cair da tarde, o barco estava no meio do mar e ele sozinho em terra. Vendo que se fatigavam a remar, pois o vento lhes era contrário, pela quarta vigília da noite dirigiu-se a eles, caminhando sobre o mar. E queria passar adiante deles. Vendo-o caminhar sobre o mar, julgaram que fosse um fantasma, e começaram a gritar, pois todos o viram e ficaram apavorados. Ele, porém logo falou com eles, dizendo: ‘Tende confiança. Sou eu. Não tenhais medo’”. (Marcos 6: 45-50)

Uma canção de Guilherme Kerr Neto inicia com a seguinte frase: “O que fazer se o coração não consegue mais crer no que sabe ser verdade? O que fazer se o coração não consegue entender o porquê da tempestade?” Gosto dessa canção por que ela nos lembra que a vida, às vezes e inexplicavelmente, fica conturbada e põe em xeque as nossas crenças; questiona, põe à prova os nossos conceitos. Afinal, eu creio? No quê? Qual o significado da minha fé? O texto que lemos é um bom ponto de partida para meditarmos sobre o que significa crer em Jesus e obedecê-lO.

Enfrentando o mar (v.45)

O texto nos diz que Jesus ordenou aos discípulos que entrassem no barco e fossem para o outro lado sem Ele. Os discípulos obedeceram a Jesus, entraram no barco e puseram-se a navegar. Para eles, uma atividade prosaica, nada de especial; afinal, entre eles havia pescadores profissionais, experimentados na navegação: Tiago, João, André e Pedro. O horário em que Jesus os despede também não significava grande obstáculo, era o entardecer daquele dia maravilhoso em que Jesus realizara o milagre espetacular da multiplicação dos pães e peixes. Mas os pescadores estavam acostumados a navegar durante a noite. Lucas nos dá esta informação na narrativa da pesca milagrosa: “Simão respondeu: ‘Mestre, trabalhamos a noite inteira sem nada apanhar; mas, porque mandas, lançarei as redes’” (Lc. 5:5). Ademais, o mar da Galiléia não lhes era desconhecido. Mas, naquela noite o mar estava agitado. As ondas do mar açoitavam o barco e o vento soprava contra os discípulos. A dificuldade era tanta que eles se fatigaram a remar contra a força do mar (v.48).

Aqui já podemos tirar uma primeira lição. Jesus não pede que façamos nada que esteja além de nossas forças, além da nossa capacidade de realização. O que Ele ordena aos discípulos é plenamente factível, ou seja, atravessar o mar. Às vezes achamos que obedecer às orientações de Jesus, seguir as Suas diretrizes, andar nos Seus caminhos é difícil demais para nós, beira o impossível. Mas, não é bem assim. Jesus nos conhece e sabe dos nossos limites e de nossas capacidades “...Deus é fiel, não permitirá que sejais tentados acima das vossas forças...” (I Cor. 10:13). Aquilo que Jesus requer de nós é algo que podemos suportar, o mesmo texto de I Coríntios nos assegura que, juntamente com a provação, Ele providenciará também os meios de sair dela e a força para que a possamos suportar. Podemos seguir os passos de Jesus, podemos obedecê-lO! Ele é fiel para nos sustentar em meio às tribulações que enfrentamos.

À Quarta Vigília da Noite (v.48)

Os romanos dividiam a noite em quatro partes de três horas, ou “vigílias” – aqui, Marcos utiliza a divisão romana. A primeira vigília ia das dezoito horas até as nove da noite; a segunda vigília ia das nove horas até a meia-noite, a terceira ia da meia-noite às três da manhã e, a quarta vigília, das três às seis da manhã. O versículo quarenta e oito fala que por volta da quarta vigília da noite, Jesus dirigiu-se ao encontro dos discípulos. Isto significa dizer que durante boa parte da noite os discípulos enfrentaram sozinhos a contrariedade do vento e o açoite das ondas. Durante várias horas os discípulos navegaram sozinhos dentro da noite escura e já estavam no limite de suas forças, já tinham esgotado todos os recursos de que podiam lançar mão. Depois de tanto tempo enfrentando a violência das ondas e o rigor do vento, eles já não tinham mais para o que apelar. Justamente nesse momento crucial, quando já não dava mais para esperar, Jesus dirige-se ao encontro dos discípulos. No momento mais angustiante Jesus foi ao encontro dos Seus discípulos. Jesus não abandona aqueles que são Seus.

Às vezes é assim que ocorre na nossa vida. À semelhança dos discípulos, os quais sob as ordens de Jesus entram no barco e navegam para ‘o outro lado’ (v.45), obedecemos as ordens de Jesus, seguimos os Seus mandamentos, pautamos nossas ações segundo Suas orientações, mas isto não impede que a tempestade nos alcance. E quando a tempestade chega e alcança o mar da nossa vida, muitas vezes buscamos o Senhor Jesus; gritamos por socorro, mas só encontramos escuridão... O que o texto nos ensina é que Jesus vem na hora certa, no momento limite, para fazer sossegar nosso coração mediante a Sua palavra. “O choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã.” (Salmo 30:5). Esta lição os discípulos aprenderam naquela madrugada em meio ao mar revolto.

Há um detalhe no texto que não podemos deixar passar despercebido: Jesus dirige-se ao encontro dos discípulos lá por volta da quarta vigília da noite, por que estava vendo que eles se fatigavam a remar. Jesus vê o nosso sofrer! Não somos apenas nós que vemos o quanto sofremos, o quanto nos desgastamos no enfrentamento das dificuldades e das tribulações que nos sobrevêm. Ele também vê e, por este motivo, vem em nosso socorro no momento certo. Precisamos confiar nisto. Precisamos entender que, mesmo quando não O vemos, Ele está vindo em nossa direção, pois Ele é o nosso socorro presente na hora da angústia, o nosso socorro sempre alerta nos momentos de perigo, conforme nos lembra o Salmo 46:2, 3. Por este motivo não precisamos temer, “mesmo se a própria terra vacila, mesmo se as montanhas se abalam no meio do mar, se as águas do mar estrondam e fervem, e com sua fúria estremecem os montes (...) Iahweh dos Exércitos está conosco, nossa fortaleza é o Deus de Jacó! (...) Tranquilizai-vos e reconhecei: Eu sou Deus”. Em meio à tempestade, precisamos ouvir a voz de Jesus falando conosco: “Sou eu. Tenham confiança”.

Ter confiança em Jesus é entender que os nossos desastres e tempestades não pegam o nosso Senhor de surpresa, e que todos os nossos dissabores estão sob o controle de Deus... É nisso que reside a nossa esperança: saber que o Deus da nossa vida, o Deus da nossa história também é o Deus da tempestade. Aquele que faz a pior tempestade não durar para sempre...

A canção* de Guilherme Kerr Neto, citada no início da nossa reflexão termina com o seguinte verso: “Não duvides, filho, tenha fé!”

* Canção "Tomé da Fé", Cantata "Eram Doze" - Letra: Guilherme Kerr Neto; Música: Jorge Camargo e Jorge Rehder

ESPIRITUALIDADE, CULTURA DE PAZ E O DESAFIO URBANO

Por Jamieson Simões.
Qual não foi minha expressão de perplexidade ao constatar o óbvio: A Espiritualidade no contexto urbano é um desafio vivenciado por todos. Somos parte de um povo muito religioso; mesmo com o crescente número dos “Sem-religião”, ainda assim somos um continente de gente religiosa das mais variadas matizes, africanas, ameríndias, européias e orientais inclusive.
Mas ser religioso não implica necessariamente em espiritualidade, digo isso com muito pesar, mas historicamente a religião expressa um jeito de vivência que não dialoga, nem propicia um exercício, uma prática voltada para a construção de uma cultura de/com/para a Paz, peço licença para citar um exemplo crasso – Os Jesuítas, que com sua metodologia ortodoxa “catequizavam” os habitantes primeiros deste chão à cruz e a espada.
O que estou tentando afirmar é: Não basta se religioso, nem basta ter uma experiência mística, nem muito menos viver uma espiritualidade para contribuir na construção de um mundo melhor. É preciso tudo isso, mas é necessário que estes elementos do ethos humano respondam aos desafios atuais geracionais, de sustentabilidade, de enfrentamento às diversas violências contra mulheres, crianças e adolescentes prioritariamente, que urgem nesta amálgama de contradição chamada de cidade.
Neste sentido, proponho um debruçar-se sobre algumas questões que no meu julgamento são de primeira ordem para uma compreensão e militância de uma espiritualidade que evidencie no cotidiano uma cultura de/com/para a Paz. São eles:
ESPIRITUALIDADE E O CONTEXTO URBANO – A cidade já foi vista como lugar de oportunidade, sinônimo de crescimento, de desenvolvimento, de saberes e também lugar de cura, mas esse olhar foi paulatinamente substituído pôr outros antônimos, tais como: Centro de exploração, desigualdades, lugar de morte, sofrimento e dor. É exatamente aqui que a espiritualidade tem sua principal contribuição, valores espirituais como solidariedade, amor (mesmo que soe como vocábulo desgastado, afirmamos seu poder na construção de novas relações), sentimento de pertencimento a Um todo, podem transformar a ordem da cidade, gerando espaços onde se torna possível a dignidade, o diálogo, a tolerância; enfim, torna possível a vida plena para cada habitante e de modo especial para as minorias. Encontrar o DO (caminho nas artes marciais), o KI (Energia vital, para alguns ramos orientais) é imprescindível para que as pessoas possam se harmonizar com elas mesmas e com a cidade, é preciso um religare das pessoas com o contexto urbano, no sentido de transformação das relações e dos valores que regem a vida na cidade. Aqui penso que um caminho, uma metodologia possível para esta transformação reside em educar a espiritualidade e espiritualizar a educação.
ESPIRITUALIDADE PARA EDUCAÇÃO DA ALMA – Temos em nossa cultura variados exemplos de como perceber a vida e expressar esta percepção através da alma e dos sentidos, lanço mão do vulto cultural de Patativa do Assaré para exemplificar como seria uma educação para a alma. A poesia e a música são metodologias que convidam a transcendência, feito as devidas ressalvas (Não se eleva o espírito, nem muito menos os valores escutando “A bicicletinha” ou coisa do gênero) podemos nos valer destes bens culturais da humanidade para a educação da alma. A poesia nos comunica um olhar diferenciado da vida, do amor, das situações, das perdas pessoais e coletivas, das saudades, dos lugares, sensibiliza o leitor e o convida graciosamente a partilhar de tais experiências, é um convite ao rompimento do que é comum, aparente, a poesia fala das coisas do coração, aquelas que apenas balbuciamos em ocasiões fortuitas, a poesia fala de nós mesmos, e por isso é universal e inclusiva, não conheço nenhuma Ode ao desmatamento, ou um soneto á violência, ou um repente que aluda à desigualdade das relações sociais com celebração, antes o faz como denúncia de sistemas desumanos e corruptos (vide vaca estrela e boi fubá, poema de Patativa musicalizado por Raimundo Fagner). Já pensou se as crianças em nossas escolas aprendessem a codificar os signos do alfabeto através de poesias e prosas? Nomes como Cecília Meireles, Raquel de Queiróz, Patativa do Assaré, Os Donatos na lista de autores das cartilhas? Imaginou uma educação assim? E a musicalidade? As rimas? A progressão dos versos seria diretamente proporcional a elevação das relações dentro e fora dos limites da escola. É preciso educar a alma para que esta venha a ser aquilo que mais aspira: ser humana, para humanos seres.
ESPIRITUALIDADE PARA EDUCAÇÃO DOS DESEJOS – Lembra das disciplinas espirituais? Jejum, Oração, Contemplação, Meditação, sempre fizeram parte do arcabouço das principais práticas espirituais em todas as religiões, e fora delas também. Estas práticas possuem a função pedagógica de educar nossos desejos, o jejum disciplina a boca, afinal, quem controla a boca, controla o restante do corpo e assim segue com cada disciplina educando uma parte de nós, que teimosamente insiste em não se submeter ao controle, antes é ávida por mais, sempre mais. Num contexto absurdo de concentração de renda e consumo, urge a disciplina dos desejos de posse:

Tenho minha própria religião. Freqüento a igreja das compras, onde sacrifico meu cartão de crédito em troca de objetos preciosos que me ajudam a circular pela vida. Mas quando nenhum objeto consegue me fazer descarregar a tensão, então busco o deus que eu criei em minha mente. Os que dizem que não rezam a nenhum deus ou que não tem religião alguma são uns mentirosos: Pergunta-lhes qual é a equipe de seus amores e descobrirás seu deus. (Kate Lockart, 21, UK – Orações, Ed. Paulus, 2000).

Não é a toa que os shoppings construídos em nossa cidade são como catedrais, onde se celebra a uniformidade em detrimento da diversidade, o acúmulo em detrimento da partilha, a estética em detrimento da ética. Educar os desejos e não negá-los, e a tarefa das disciplinas espirituais, nos auxiliando a encontrar um equilíbrio que torne possível a sustentabilidade da vida humana e do planeta.
 ESPIRITUALIDADE QUE LEVE EM CONSIDERAÇÃO A CONDIÇÃO HUMANA – Não consigo precisamente apontar como foi a construção do ideal espiritualizado comumente apresentado, mas fato é que a idéia do isolamento, o distanciamento da realidade, a negação dos desafios formam a matriz equivocada daquilo que aqui chamamos de espiritualidade, acredita-se neste imaginário em homens e mulheres extra-humanos, semi- divinos, capazes até de atos incríveis à nossa realidade. Esta espiritualidade equivocada não serve à construção de uma cultura de/com/para a Paz, visto que está alienada da vida, das pessoas, do divino. A espiritualidade que fortalece os vínculos e a pertença comunitária leva em consideração a condição humana que marca indelével de contradição, paradoxo, dialética e dialógica de nossa existência. Somos um devir, que ocasionalmente se apresenta no presente, mas que se torna real no futuro, estamos em construção, e a espiritualidade deve elevar o ser humano à sua potência máxima de humano-divino, ao mesmo tempo em que convida à transcendência, convida também à transformação de sua realidade e entorno, afinal, onde os pés pisam, a cabeça pensa e o coração ama, é aqui onde a espiritualidade faz a aliança entre o efêmero e o eterno, entre passado, presente e futuro, entre vida e prática, fé e engajamento político, aqui no tempo que se chama hoje, nos confrontamos com aquilo que somos e aquilo que devemos e queremos ser, e não apenas confrontar, antes apontar caminhos possíveis e coletivos para a construção deste ser humano, que em dores de parto está para nascer.
ESPIRITUALIDADE QUE FORTALEÇA A RESILIÊNCIA – Resiliência para Leonardo Boff “é a capacidade de não deixar que as coisas ruins da vida tenham a última palavra”. Gosto desta definição, ela alude á uma verdade espiritual chamada de Esperança, é aquela cisma matuta de pensar em como uma realidade hostil pode ser mitigada, é um jeito teimoso da vida de insistir na existência e não há nada mais sagrado e valioso que a vida. A espiritualidade fortalece esta capacidade comunitária e pessoal de pensar saídas, coexistência com desafios que extrapolam suas capacidades de resposta imediata, mas ainda assim resta esta teima em seguir com a vida. A figura do sertanejo que enfrenta a seca, ano após ano, ciclo de verde, ciclo de seca, mas basta o cheiro das águas e a caatinga em festa reverdece, e a vida vence sempre, seja na cheia ou na estiagem esta gente resiste, resiliente, às vezes até resignadamente, mas afirma sua luta, sua terra, seu trabalho. Também é assim na urbanicidade com os “casqueiradores” que no lixo dos que tem, encontram a subsistência sua de cada dia, com suas carroças enfrentam e vencem o demônio do trânsito, vencem a fome, superam o cansaço e arrancam o mínimo de dignidade, arrancam desta sociedade que indiferente teima em não lhe assumir como sujeito de direitos, agente de transformação e contribuição ecológica. A espiritualidade caminha com a vida e não pode ser alheia as dores e desafios comunitários. E por ser caminhante e companheira da vida reforça positivamente a Resiliência, a fé em dias melhores para sempre em toda e para toda a comunidade.
Afirmo que onde a espiritualidade se expressa respondendo a estas e outras possibilidades a cultura de/com/para a Paz encontra um terreno fértil para florescer, afinal a cultura é a tecelagem de muitos fios, família, valores, música, oralidade, arte, comida, bebida, rituais. Dentre estes fios a espiritualidade se entrelaça com aqueles que agregam valor e protegem a vida, é no altar da existência que se encontram a cultura de/com/para a Paz e a espiritualidade, que não é utópica, antes é realidade em muitas pessoas e comunidade, que aprenderam a resolver seus conflitos, a lidar com suas diferenças, sem prescindir da violência como mediadora do direito.
Nas periferias de toda grande cidade há de haver um refúgio, um nicho de resistência, que através de uma vivência espiritualizada irradia uma cultura, um modus vivente de Paz, com Paz e para a Paz. Quem tem olhos para ver e ouvidos para ouvir, verá e ouvirá.

domingo, 17 de outubro de 2010

LIDANDO COM O PRESENTE E O FUTURO

Um dos maiores problemas que enfrentamos é o medo do futuro, a dificuldade de lidar com o amanhã. A canção pergunta: “Como será o amanhã? Responda quem puder. O que irá me acontecer?...” E nós também fazemos nossos próprios questionamentos: “Será que vou morrer cedo demais? Será que terei condições de sustentar minha família dignamente pelos próximos, digamos, vinte anos? Será que conseguirei me formar, me casar, etc.? E assim por diante... O fato é que temos medo do desconhecido porque não temos controle sobre ele e isto nos atemoriza.
Lendo a Carta aos Exilados que o profeta Jeremias enviou aos seus compatriotas deportados na Babilônia, fiquei encantado com a forma como ele os encoraja a enfrentar a difícil situação que atravessavam. O texto está registrado na Bíblia Sagrada, no livro de Jeremias, no capítulo 29, nos versículos 1 até o 14a. Quando o profeta escreve a carta, o povo de Israel, ou melhor, parte do que sobrou dele estava já há algum tempo no cativeiro da Babilônia - cerca de quatro anos - e aquelas pessoas tinham sido avisadas anteriormente por Jeremias que ficariam no cativeiro por setenta anos. O povo sobrevivente trazia consigo uma expectativa: Por quanto tempo ficaremos aqui? Será que serão realmente setenta anos? É nesse contexto sombrio, de incerteza, que o profeta traz palavras de encorajamento que podem nos ajudar hoje, mesmo tendo sido ditas há muitos séculos:
“5 Construam casas e morem nelas. Plantem árvores frutíferas e comam as suas frutas. 6 Casem e tenham filhos. E que os filhos casem e também tenham filhos. Vocês devem aumentar em número e não diminuir. 7 Trabalhem para o bem da cidade para onde eu os mandei como prisioneiros. Orem a mim, pedindo em favor dela, pois, se ela estiver bem, vocês também estarão.”
O que acho fantástico nessa citação é que o profeta estimula as pessoas a tomarem pé da situação, a fincar os pés na realidade. Já que estavam lá na Babilônia, tinham mais é que viver as suas vidas, nada de ficarem a choramingar a saudade (legítima, é verdade) de sua terra natal, mas eles estavam vivos e precisavam tocar a existência. “Construam casas e morem nelas!” é um desafio ao recomeço, é um estímulo a refazer a vida. Nos momentos em que os sonhos vêm abaixo, a Bíblia nos sugere a reconstrução da vida.
Para aquelas pessoas desterradas e cativas, Jeremias escreve, ainda: “Plantem árvores frutíferas e comam as suas frutas. Casem e tenham filhos...”. Que coisa interessante! Plantar uma árvore para depois comer os seus frutos é um projeto de médio/longo prazo; casar, ter filhos e ver os netos nascerem também demanda tempo. Num contexto de morte, de desesperança e falta de perspectiva, o profeta traz uma palavra de esperança no futuro e de fé na vida.
É importante observar que a palavra do profeta transcende os limites da individualidade, engloba o coletivo. Se cada um deve reconstruir sua vida, cuidar da própria sobrevivência, esforçar-se particularmente para sobreviver; nem por isso deve esquecer de que vive em comunidade e, por isso, deve colaborar para que toda coletividade experimente a paz e o bem estar. O versículo sete fala sobre isso: “Trabalhem para o bem da cidade para onde eu os mandei como prisioneiros. Orem a mim, pedindo em favor dela, pois, se ela estiver bem, vocês também estarão.”. Trabalhar pelo bem da cidade é se engajar na construção de uma cultura de paz; além do que, expressões como altruísmo, colaboração, solidariedade e bem comum, são palavras de ordem no alimentar da esperança e na realização do futuro.
Finalmente, é necessário lembrar que se no agora temos alguma condição de interferir na realidade que nos cerca por meio do desejo de realizar e vencer as situações difíceis; existe, por outro lado, um futuro que é incerto e sobre o qual não temos controle. E, aí, depois de mostrar o que cada um pode fazer no presente por si e pelos outros, o profeta apresenta alguém que, por mover-se na eternidade, além de saber a dor do presente e também conhece o futuro. E, mais do que conhecer, tem em si o poder de interferir e garantir esse futuro.
“11 Só eu conheço os planos que tenho para vocês: prosperidade e não desgraça e um futuro cheio de esperança. Sou eu, o SENHOR, quem está falando. 12 Então vocês vão me chamar e orar a mim, e eu responderei. 13 Vocês vão me procurar e me achar, pois vão me procurar com todo o coração. 14 Sim! Eu afirmo que vocês me encontrarão.”
Há coisas que podemos fazer, outras estão além de nossas possibilidades. É nessas horas que podemos contar com o poder, a fidelidade e o amor do Deus que tem em Suas mãos o nosso futuro e com base nisso podemos enfrentar o agora com coragem e o porvir com esperança. São belos os verbos usados pelo profeta para o enfrentamento da vida: construir, plantar, trabalhar e orar. É o que podemos fazer no momento. Quanto ao futuro que tanto nos inquieta, bem, o melhor é confiar no que a Bíblia diz: “Só eu conheço os planos que tenho para vocês: prosperidade e não desgraça e um futuro cheio de esperança. Sou eu, o SENHOR, quem está falando.” Resta-nos confiar e esperançar.
“Como será o amanhã?
Responda quem puder.
O que irá me acontecer?
O meu destino será como Deus quiser
(O Amanhã, canção de João Sérgio)
Jason Simões